João Joaquim de Melo, um dos coordenadores do Banco Palmas, escreve sobre o protagonismo popular que levou à criação de pequenos empreendimentos que estão mudando a vida da população mais pobre do Conjunto Palmeira

Elias, 22 anos, é jovem, negro, cabelos e pele caracterizados pela cor. Pobre. Arrimo de família. Sustenta sua mãe e dois sobrinhos (ainda crianças). Moram todos no Conjunto Palmeira na beira do Rio Cocó. Aliás, do outro lado do rio. Todos os dias, Elias atravessa o Cocó com água no meio da cintura e, quando chove, o jeito é nadar. Pode parecer roteiro de um filme. Mas essa é uma história da vida real. Voltando a ela, perguntamos: o que Elias faz todos os dias para conseguir sustentar sua família? Ele rouba? Vende drogas? É catador? Engraxate? Flanelinha? Biscateiro? Não. Ele é um empresário. Isso mesmo. Elias se organizou com mais 04 jovens, tomaram um empréstimo em um "banco", criaram e registraram uma microempresa de material de limpeza: a PalmaLimpe. Perfeito! Posso afirmar, portanto, que Elias é um empresário com a mesma convicção que afirmo que o Sr. Bill Gates o é.

A história de Elias vai mais à frente. Ele um dia conheceu uma jovem, baixinha, negra, moradora do Conjunto Palmeira e também pobre! Ela se chama Emanuela e organizou um cursinho pré-vestibular na comunidade. Convidou Elias. Ele aceitou e... nossa! Quanta emoção! Elias passou, em janeiro de 2008, no vestibular da UECE e da UFC. Agora além de empresário é Universitário. Essas conquistas só foram possíveis primeiro porque Elias é um lutador! Depois, porque existe no Conjunto Palmeira um banco comunitário: o Banco Palmas. Um banco diferente, com a compreensão de que a cidade se desenvolve a partir dos bairros. E o bairro só se desenvolve se a comunidade se "empoderar" e "tomar conta" de seu desenvolvimento econômico, social, cultural; focado na criatividade e solidariedade entre os moradores.

Esse é o segredo de Elias. Além de "oportunidade" ele consegue no Conjunto Palmeira "emoção"! Oportunidade de emprego, trabalho e renda. Emoção por ser ele o protagonista de sua própria história. Acreditamos ser esse um caminho para ganharmos a guerra contra "as violências". Tanto a física como a psicológica. É preciso tornar os bairros um espaço de prazer e não de dor. De orgulho e não de vergonha. Portador de imaginação e respostas e não de monotonia e abandono. É preciso gostar do bairro, sentir emoção por morar nele, "quando a gente ama é claro que a gente cuida..."! É possível construirmos esse bairro do cuidado que supera a violência? Claro que sim! Precisamos apenas de duas coisas: decisão política para se desenhar um modelo de desenvolvimento para a cidade que priorize o desenvolvimento endógeno dos bairros e um grande processo de mobilização, organização, formação e capacitação dos moradores das periferias para que eles se tornem protagonista desse processo.

Ps.: Vou contar um segredo... não espalhem pra ninguém: Elias e Emanuela estão namorando e formam um lindo casal!

João Joaquim de Melo - Especial para O POVO – 12/04/08

Retour à l'accueil